quinta-feira, 18 de abril de 2013

Monteiro Lobato seria racista?

A adoção de uma obra literária, seja a instituição de ensino pública ou privada, se dá de acordo com uma determinada proposta pedagógica visando, além da formação do hábito de leitura, objetivos mais específicos estabelecidos para cada disciplina/conteúdo.  

Portanto, mesmo um leigo poderia inferir que um livro em que se narre cenas de violência e tortura contra uma criança não deveria ser adotado gratuitamente. Que resultados estariam sendo almejados ao se introduzir o educando nesse universo de extrema brutalidade? 

O autor do conto Negrinha, Monteiro Lobato, descreve com completo pouco caso as torturas a que uma criança negra era submetida... Assim como, no relato da sua morte (que o leitor poderia deduzir ser resultante dos maus tratos),  não lhe dedica, o Autor, qualquer observação que denote um juízo de valor, tudo é tratado como se corriqueiro fosse (E sabemos que, de fato, era):
"Traga o ovo.
Veio o ovo. Dona Inácia mesma pô-lo na água a ferver; e de mãos a cinta, gozando-se na preliberação da tortura, ficou de pé uns minutos, à espera.[...]- Abra a boca!Negrinha abriu a boca, como o cuco, e fechou os olhos. A patroa, então, com uma colher, tirou da água ‘pulando’ o ovo e zás! na boca da pequena. E antes que o urro de dor saísse, suas mãos amordaçaram-na até que o ovo arrefecesse. Negrinha urrou surdamente, pelo nariz. Esperneou. Mas só. (fl. 22).
Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos, como um gato sem dono. (fl. 25)[...] A terra papou com indiferença aquela carnezinha de terceira – uma miséria, trinta quilos mal pesados... (fl. 26)"
Então, restaria àqueles que apresentaram a obra ao Ministério da Educação, visando participar da licitação em que o MEC selecionaria obras para o Programa Nacional Biblioteca na Escola, a obrigação de contextualizar o assunto. Não o fizeram alegando não ser necessário. Será que são, realmente, profissionais ou, simplesmente, oportunistas? 

Diante dessa situação, não é possível atinar com o motivo pelo qual há uma classe de intelectuais e de educadores que, em manifestações na Internet, criticaram a iniciativa dos autores da petição, em seu intento de livrar nossas crianças desse enorme engano. Mas é possível atinar com os motivos pelos quais os pais permaneceram inertes, ignorando a questão. 

E ainda tem gente que acha que a redução da maioridade é que vai solucionar a questão da delinquência juvenil. Ignoram que a falta de educação é que mata; ignoram que sem educação não há segurança possível.   Afinal, quantos efetivos policiais e aparatos de segurança seriam compatíveis com turbas cada vez mais numerosas de selvagens, drogados, excluídos de um sistema educacional eficiente?

Os que, agora, põem-se a clamar, até, pela pena de morte, provavelmente advogariam, também, o retorno da palmatória e de outros "hits" pedagógicos do século passado: acreditam que apanhando se aprende. Quem sabe, até, aprovariam o "ovo quente" que a torturadora da obra de Lobato usou para maltratar uma criança indefesa.

Pessoas sádicas, desde que o mundo é mundo, se divertem em atormentar o próximo; o comportamento que Lobato retrata não é pior do que aquele que traficantes impõem, como punição, em comunidades dominadas, e que vemos noticiado pelos jornais... A questão, para além do racismo explícito de Lobato, é a utilização de uma obra com esse teor, em nossas escolas, de forma descuidada. Não é admissível! O descuido, em geral, com a educação é revoltante. Não é à toa que, por aqui, um estudante universitário vale quase oito vezes mais que um estudante do ensino fundamental.

Estão de parabéns os educadores Antonio Gomes da Costa Neto e Elzimar Maria Domingues que ousaram protestar contra a adoção da obra.

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