sábado, 25 de dezembro de 2010

Contra o convencionalismo, a favor de Ivan Illich. Por quê?

No post anterior, relembrei Ivan Illich. Esse pensador me impressionou de forma definitiva quando, ainda na Faculdade, por proposta da professora da cadeira de Metodologia Científica, fiz a leitura, resumo e comentário da sua obra mais famosa: Sociedade sem Escolas.

Não fosse a zelosa professora Maria Bueno e eu estaria, até hoje, ignorando conceitos arrojados que me ajudaram a confirmar muito do que eu já intuía e a me desvencilhar, de vez, de preconceitos e equívocos sobre a minha suposta incapacidade e sobre as capacidades de profissionais e de suas instituições. Valeu por uma terapia. Ou, quem sabe, mais que uma terapia.

Na época, eu já era mãe de quatro crianças, dois deles portadores de alergias severas. Lutando com o uso da medicação convencional para essa patologia (que, ainda hoje, é o que há: corticóides e aminofilina), eu começava a descrer da Medicina. Sempre buscando a transcendência, eu assinava uma revista chamada "Planeta" e, ali também, fui surpreendida por idéias tão arrojadas quanto as de Illich: Por que o homem é o único animal que bebe leite a vida inteira? Por que beber leite de outros animais? E eu, comigo mesma: Não deveria beber???!!!!! Trocamos o consumo da mandioca (herança indígena) pela ingestão do venenoso trigo branco... E que mal haveria , no pãozinho de cada dia, pensava eu com espanto!?

Era o início da década de 80, estávamos muito distantes das liberdades dos tempos presentes e dos avanços da Nutrição. Aliás, tudo o que se referisse ao tema alimentação estava restrito ao âmbito doméstico, portanto, alvo de menosprezo, coisas de mulher. Mas, tive a sorte de ler os artigos de um médico, Dr. Márcio Bontempo, um homem que ousava pensar, naquela revista despretensiosa, a "Planeta".

Eu me recusava a aceitar quando alguns profissionais de saúde teimavam em me fazer acreditar que o resultado de uma operação dois mais dois não era quatro. Ou seja, eu via os efeitos devastadores da aminofilina no organismo do meu filho que me dizia: mãe, eu estou triste, mãe, estou cansado... não sei porque eu estou triste, mole...

O remédio provocava depressão na criança... O Pediatra dizia que não. Eu preferi acreditar no que via e desistir da medicação.

E, enquanto meus filhos cresciam, minha experiência se consolidava: é difícil lidar com profissionais diplomados, principalmente da saúde, porque descartam o outro como ser pensante, porque negam evidências ao invés de admitir que não tem todas as respostas. Na educação, pude testemunhar a forma como respostas criativas dos meus filhos eram descartadas como erradas por variados professores, enquanto cursavam o ensino de 1º grau.

Portanto, com esse sentimento de desconforto, resultado de experiências tão negativas, conhecer o pensamento de Ivan Illich foi, para mim, libertador.

E, daí, surge o meu interesse pelo tema "saúde e educação" e a vontade de tratá-los, numa visão integrada: a saúde vem da alma e a educação é que a constrói.

Quem é o doente? É quem persegue o próximo, é quem rotula e exclui...é todo aquele que, movido pela própria rigidez e conservadorismo, ultrapassa os limites daquilo que alega estar defendendo: seja a saúde, seja a educação, a decência, a ética, a moral e os bons costumes...

A propósito, vale lembrar a postagem anterior, sobre Júlio Assange:  invocar sigilo de estado para ocultar ações criminosas, ou duvidosas, não seria imoral é doentio? Quem tem esse pecado, ou doença, não poderia atirar pedras em Julian Assange. Precisa, fundamentalmente, curar-se, ou melhor, educar-se...

Tanto é verdade que a educação condiciona a saúde que, hoje, quando se busca o controle de peso, a palavra chave dos nutricionistas é reeducação. E, se alguem infarta, o cardiologista logo propõe a formação de novos hábitos ou seja: reeducação. Aos deprimidos, a ciência já recomenda a prática de atividades físicas, que estimulam a produção de dopamina e serotonina, visando a redução gradativa de medicamentos.

Fica cada vez mais claro que o uso de um arsenal de remédios e a repetição de exames sofisticados e dispendiosos, podem ser suprimidos quando as pessoas são orientadas a cuidar de si mesmas.

E a nossa suposta incapacidade, frente à pseudo-proteção das instituições, começa a ser questionada, felizmente. Até porque, o Estado já se sabe incapaz de prover cuidados para a massa sempre crescente de doentes.
A razão, portanto, sempre esteve com Illich quando defendia a autonomia do cidadadão contra a supremacia das instituições.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Julian Assange

Julian Assange ousou desafiar os poderes estabelecidos publicando segredos muito bem guardados, vazando documentos sobre crimes de guerra que teriam sido cometidos pelo exército americano, no Afeganistão e no Iraque. Assange, criador do WikiLeaks, site que publica, anonimamente, informações confidenciais vazadas de governos e de empresas, está em prisão domiciliar, na Inglaterra.

Os podres estão expostos e quem os guardava faz o que os donos do mundo, em todos os tempos, sempre fizeram aos rebeldes: persegue.

Leio rapidamente essas notícias e penso no que li, há duas décadas, em um livro chamado "Sociedade sem Escolas", do pensador Ivan Illich, um outro radical. Illich falava da dependência subserviente do cidadão  às instituições (principalmente à escola) que, gradativamente, subtraíram de nós a nossa capacidade de subsistir por meios próprios, de pensar com mínima autonomia, de expressar a própria criatividade, de ousar seja lá o que for. E ai dos que ousam! Se estão em situação de trabalho, logo são sabotados, sofrem assédio, são desacreditados pelos medíocres, sob os olhos dos donos e de gerentes que, um dia, certamente, foram ousados.

Illich foi um visionário que enxergou algo bastante óbvio, como é próprio dos visionários. Enxergou o que é conhecido dos Psicólogos: a educação institucional, com seus esquemas de "certo x errado" limita e cerceia a criatividade. Com efeito, a escola pode ser intimidadora, pode aniquilar, além da auto-estima, a capacidade crítica e a própria capacidade de aprender uma vez que, vigorando a crença de que somente a escola proporciona o aprendizado, as pessoas não são estimuladas a buscar o auto-aprendizado. 

E, agora, que Assange ataca duramente institituições poderosas usando um veículo que, por incrível que pareça, foi pensado por Illich (uma rede e tecnologia), quem sabe essa discussão, do início dos meados do século passado, venha a ser retomada.

Illich pregava a criação de redes de aprendizagem apoiadas em tecnologias avançadas o que, nos dias presentes, se faz corriqueiro embora coexista, ainda, com os antigos modelos de escola. Assange também não é amigo de instituições modernas que, revestidas de poder pelo cidadão, usam esse poder para acobertar práticas criminosas. Para quê segredo? A quem serve o sigilo? Quando o sigilo é necessário e com que finalidade?

Instituições muito poderosas, se sobrepondo ao interesse coletivo, servem a quem?